O novo ministro da Fazenda sinaliza com a opção pelo gradualismo, ao declarar que o objetivo é estabelecer uma meta de superávit que contemple a estabilização e declínio da dívida pública
Julio Gomes de Almeida | Publicado originalmente no Brasil Econômico
Ao longo dos últimos anos, a economia brasileira foi reduzindo sua taxa de crescimento da faixa de 4% do período anterior à crise global de 2008 para o patamar de 3% em 2011, depois para 2% entre 2012 e 2013 até chegar à virtual estagnação em 2014. No contexto de despesas públicas inflexíveis e com crescimento vegetativo relativamente alto, aliado a apostas caras de política econômica que não deram o resultado esperado em recuperar o crescimento, a gradativa desaceleração da economia foi ingrediente decisivo do presente desarranjo fiscal. Ela retirou de cena a variável que acomodava os avanços de despesas, vale dizer, a elevada elasticidade da receita tributária com relação ao crescimento econômico. Em 2014, o aumento real das receitas tributárias vem sendo negativo.
Por isso, dependendo de como será concebido o programa fiscal do novo governo, a economia poderá atingir outro grau em sua trajetória adversa se o ajuste recair sobre cortes de despesas, especialmente se o sacrifício determinar o declínio do investimento público ou itens de despesa que afetem o consumo popular. Como decorrência, o PIB pode ter variação negativa, com consequências muito graves para a receita tributária. Nesse caso, uma melhora fiscal significativa somente poderá ser lograda com aumento de impostos. Uma maior confiança do mercado financeiro poderá ser obtida, mas a um preço alto porque, do outro lado — ou seja, do lado da economia que investe e gera demanda — as consequências do ajuste fiscal poderão aprofundar ainda mais as expectativas pessimistas entre empresários e famílias.
Por isso o programa de ajuste precisa reunir gradualismo em sua execução e muito tato na seleção e na dosagem em itens de despesa e de tributação que serão objeto de revisão ou reestruturados. O primeiro pronunciamento do novo ministro da Fazenda parece indicar a opção pelo gradualismo ao declarar que “o objetivo imediato do governo e do Ministério da Fazenda é estabelecer uma meta de superávit primário para os três próximos anos que contemple a estabilização e declínio da dívida pública”. Para 2016 e 2017, anunciou a meta de resultado primário de 2% do PIB, ficando em 1,2% do PIB a meta para 2015.
Cabe chamar a atenção para a importância do detalhamento das medidas que serão implementadas, onde também reside uma parte relevante do plano fiscal. Como foi observado, as medidas de cortes de despesas e aumento de impostos devem obedecer a vários critérios, mas, como a economia encontra-se especialmente fragilizada, será necessário um criterioso trabalho de seleção dos itens com menor capacidade de deprimir a demanda agregada, especialmente o investimento. Desonerações sobre alguns bens duráveis de consumo devem ser revistas. Uma cuidadosa majoração dos créditos subsidiados dos bancos públicos poderá ser feita sem maiores prejuízos para as inversões privadas. Caso se imponha o aumento da carga tributária, a majoração de certos impostos pode ter efeito moderado no gasto dos agentes, por terem incidência mais pulverizada, como a Cide e o IOF.
Uma cautela particular deve ser dedicada aos recursos do BNDES. O novo governo deseja interromper o aporte de novos recursos ao BNDES como medida para estancar o endividamento público. Os créditos de uma instituição de fomento não podem ser interrompidos subitamente, sob pena de que investimentos já planejados e mesmo investimentos já contratados junto aos bancos públicos percam a sustentação de financiamento, sem que fontes alternativas se apresentem para suprir a lacuna.
Neste caso, o risco é que planos de investimentos empresariais concebidos e, em alguns casos, já em execução, sejam suspensos. A queda do investimento seria inevitável e deixaria de existir uma receita tributária da qual o ajuste fiscal não deveria abrir mão. A interrupção não programada do fluxo de recursos para o BNDES poderia ainda desorganizar o sistema de financiamento público de longo prazo no Brasil, que é exemplar em termos mundiais.
O grande objetivo do programa fiscal está em ajudar a recuperar a confiança na política econômica e na economia por parte dos agentes cujas decisões de financiar, investir e consumir constroem o dinamismo e o progresso econômico.