Julio Gomes de Almeida * | Publicado originalmente no jornal Brasil Econômico
O emprego nas grandes regiões metropolitanas brasileiras, segundo o IBGE, já enfrenta problemas visíveis. Somente o retraimento das pessoas que se dispõe a trabalhar serve de compensação a tais problemas e, ainda assim, de forma parcial. Em agosto, a taxa de desemprego só não foi maior do que os 5% apurados porque, relativamente há um ano, um menor número de pessoas procurou trabalho. A ocupação diminuiu, o que, em uma situação em que mais pessoas procuram emprego, teria elevado a taxa de desocupação. Não é de hoje que isto ocorre, pois a melhora de renda das famílias, a abertura de cursos de formação técnica e o mais amplo acesso ao ensino superior deram aos jovens maior condição de planejar sua inserção no mercado de trabalho.
Esse processo pode estar em vias de ser revertido e um sinal disso é que a passagem de julho para agosto registra aumento dos que procuram trabalho, talvez como decorrência de outra tendência que vem se delineando mês após mês no mercado de trabalho urbano. Trata-se da perda muito significativa de ritmo de aumento do rendimento médio da população ocupada. Em agosto, com relação ao mesmo mês do ano passado, o rendimento médio real cresceu 2,5%, um índice que pode ser considerado razoável, porém bem inferior aos percentuais próximos a 4% que vigoravam até 2012. Ademais, em grande medida esse aumento deveu-se à elevação real na categoria de militares e funcionários públicos, enquanto o rendimento médio da massa de trabalhadores com carteira assinada no setor privado, assim como o rendimento dos que não têm carteira assinada, tiveram evolução de apenas 1%. Em suma, já não cresce como antes a renda do trabalho, o que pode estar induzindo uma fração maior da população a ingressar no mercado.
A combinação desses processos define a marcha da massa real de rendimentos, a base do consumo varejista. A massa de rendimentos vem também minguando sua expansão que por muito tempo teve alto crescimento, como 6% ao ano, levando a um dinamismo das vendas varejistas que não raro superava 8%. Pois bem, em agosto desse ano sua evolução frente a agosto de 2013 foi de apenas 2%, o que certamente levará a uma evolução das vendas do varejo não superior a 3% até o final do ano.
Emprego em baixa, rendimento em ritmo mais lento e massa de rendimentos com modesta expansão são as consequências já visíveis da desaceleração da economia brasileira. De onde vem a mudança no emprego que ensejou esses resultados? Do ponto de vista dos setores econômicos, tem origem na indústria, que no espaço de um ano compreendido entre agosto de 2013 a agosto de 2014, demitiu 111 mil pessoas. A crise que arrasta a indústria para uma retração prolongada não dá sinais de que possa vir a ser revertida tão cedo, o que coloca a questão do emprego em situação difícil, a menos que a queda da ocupação também muito acentuada em outros segmentos (como serviços domésticos, -103 mil) seja estancada e aumente a criação de postos em serviços prestados às empresas e em serviços pessoais, o que ainda não está à vista. Por isso, possivelmente o retraimento do número de pessoas ocupadas não será interrompido no corrente ano e também no próximo.
É muito importante observar que a mudança no mercado de trabalho passou a afetar o emprego formal, ao contrário do que ocorria até então. O IBGE registrou queda no número de pessoas com carteira assinada entre agosto de 2013 e agosto último (-6 mil postos). O aumento do desemprego já vinha ocorrendo em larga escala entre os empregados sem carteira, cujo montante foi de 290 mil em agosto último relativamente ao mesmo mês do ano passado. Tal assimetria explica-se pela relativa escassez de mão de obra mais qualificada, o que faz com que o empresário pense duas vezes em se desfazer de seus quadros já treinados e adaptados ao processo produtivo. É também consequência dos custos de demissão, muito maiores no caso do emprego formal. A contrapartida da destruição de emprego formal e, sobretudo, informal, foi o aumento dos trabalhadores por conta própria (+235 mil), em uma indicação de que o subemprego serviu de via de escape.
* – Julio Gomes de Almeida é Ex-Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda