Apresentação #06

Esta edição especial da Revista Política Social e Desenvolvimento traz dois artigos do professor Frederico Mazzucchelli. Nos dias atuais, apesar de observarmos o ethos neoliberal rechaçando qualquer alternativa à dominância dos mercados e uma incipiente capacidade de mobilização da sociedade, a preocupação do autor é mostrar como esse tempo foi construído, qual foi o movimento que nos trouxe até essa mentalidade específia com a qual nos defrontamos hoje.

Como diz o título do primeiro artigo desta edição, parafreseando Tony Judt, “Nem sempre foi assim!”, e em mais de um sentido. O caótico período que vai do início do século 20, passando pelas duas Guerras Mundiais e a crise de 29, certamente foram tempos muito piores do que o que vivemos hoje, tempos de crise, desemprego e violência em massa. Entretanto, daqueles tempos emergiu também, após a Segunda Guerra Mundial, a necessidade de regular o sistema econômico de modo a atenuar as mazelas gestadas pelo mercado autorregulado. As respostas keynesianas à incerteza e à catástrofe promoveram um longo período de crescimento com ganhos salariais e redução das desigualdades, algo também sem paralelo na história do capitalismo.

Esse desenvolvimento histórico esteve longe de ser linear, e o artigo que inicia esta edição mostra justamente os percalços históricos pelos quais passaram diversos países, do início do século 20 até o fi dos Anos Dourados.

No segundo artigo, Mazzucchelli tece uma reflxão cuidadosa sobre as semelhanças e diferenças entre a depressão dos anos 30 e a crise econômica atual. Por um lado, na crise do início do século, os governos estavam despreparados para enfrentar um cataclismo econômico da ordem de grandeza do que ocorrera, multiplicando o impacto da depressão pela demora em tomar medidas anticíclicas efetivas. Por outro lado, a partir dali, numa série de reações tanto da sociedade civil quanto dos representantes políticos, muitos passaram a enxergar a necessidade de se contrapor ao livre jogo dos mercados, embora as formas específias de fazê-lo tenham sido amplamente distintas conforme o país – especifiidades que o autor também aponta com atenção, focando nos casos da Suécia, Alemanha, Estados Unidos, Inglaterra e França.

Na crise contemporânea, a debacle econômica foi de alguma forma atenuada pela participação ativa do Estado garantindo principalmente a solvência do sistema bancário (embora isso tenha apenas feito migrar uma crise fianceira, para uma crise das dívidas públicas). Se o cenário atual é pessimista, o mais provável é que fosse muito pior, se o que foi feito não tivesse sido feito. Já a mudança no paradigma do livre mercado, embora esteja dentro do panorama mental dos principais agentes na Europa e nos EUA, não sofreu abalo da mesma magnitude. Os protestos, descentralizados e sem lideranças, expressaram um descontentamento com a ordem sem, contudo, oferecer alternativa viável, ou propor um norte para a reorganização e regulação do sistema econômico.

Em outras palavras, o autor parece nos mostrar como a ideia thatcheriana da TINA (Thre Is No Alternative – Não Há Alternativa) sobreviveu à sua época, com o reino da alta fiança e da desregulamentação permanecendo vivo. Muito embora a crise tenha eclodido nos países do centro capitalista, seus efeitos foram sentidos principalmente nos países da periferia europeia, possibilitando que as vozes políticas mais fortes continuassem com o discurso da austeridade.

A dinâmica da crise é substancialmente distinta da que ocorreu no passado, o que Mazzucchelli nos mostra com muito mais acuidade e erudição do que essa breve introdução poderia transmitir. Convidamos todos, pois, a mergulhar nos excelentes artigos desta edição especial.

Boa leitura!

Eduardo Fagnani e Thomas Victor Conti

Editores.

 

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